Eu estudava longe
de casa e de segunda a
sexta-feira eu fazia
um
percurso de cento e
quarenta quilômetros.
Certo
dia, deixei de ir em ônibus e preferi fazer o caminho de moto que
era mais rápido e mais prático. Verifiquei tudo e parti em direção
a Rodovia dos Imigrantes, caminho já conhecido pro mim. Cheguei para
a aula sem problemas e ao fim de uma tarde muito produtiva de
estudos, observei na saída do edifício que durante o tempo passado
lá dentro, uma tempestade se formava rápida e turbulenta.
Eu
não havia me preparado pra isso, tanto que não havia levado roupa
protetora de chuva, mas confiava que antes que o temporal me
atingisse, eu chegaria a tempo em casa.
Saí
do estacionamento em direção ao centro da cidade e logo me deparei
com os semáforos que pareciam mais demorados do que o costume.
Acessei a Rodovia Anchieta com a intenção de me livrar rápido de
seu intenso tráfego de caminhões que seguiam, em sua maioria para o
porto de Santos e então, aliviado, peguei o acesso que me levaria a
Imigrantes, que por sua vez me levaria rapidamente pra casa.
Como
era fim de tarde, o clarão vespertino de repente havia se apagado e
uma chuva fina me alcançou. Com pressa de não molhar-me mais,
acelerei próximo do limite da rodovia mas o bom senso pela pista
estar molhada me chamou a razão e desacelerei. Já aceitava como
certo o “caldo” que levaria, sendo que instantes depois meu
problema seria outro.
Enquanto
divagava sobre a chateação que aquela chuva me causava, sem
perceber, peguei um acesso que seguia para o interior do estado, que
me afastava cada vez mais do meu destino. Depois de alguns minutos ao
notar algo errado, liguei o GPS que eu tinha acoplado no painel e
então vi o quanto eu já distava da minha rota original e o pior é
que o retorno mais próximo ficava a dezenas de quilômetros e eu não
tinha combustível suficiente para tanto. Minha tranquilidade virou
uma enorme apreensão, enquanto a tempestade caía, o combustível se
esvaía, carretas enormes passavam a toda velocidade por mim e eu já
me imaginava no mínimo, passando a madrugada na estrada, sem poder
ligar o celular embaixo de chuva e no máximo, morto embaixo daqueles
eixos enormes.
Mas
então resolvi parar no acostamento, me acalmar, e então calcular o
que poderia fazer. Decidi buscar no mapa eletrônico, minha posição
real e buscar mais rotas possíveis e um caminho alternativo apareceu
na tela. Para minha grata satisfação, calculei que o que eu tinha
de combustível era possível chegar a uma cidade que certamente
teria um posto de combustível, que me resolveria a vida naquele
momento. E assim eu fiz.
Imagine
a alegria de encontrar um posto e ver a pessoa “mais linda do
mundo”, motivo do meu sorriso: um frentista que eu nunca havia
visto na vida!
Uma
vez abastecido, segui de volta pra casa e a chuva já não me
incomodava, nem o frio, nem a escuridão, nem o tempo perdido. O
alívio de voltar em paz tornara todos os outros desconfortos em
nada.
Daquele
momento aprendi coisa para o tempo presente: aprendi que costumamos
pegar estradas conhecidas na vida mas essa mesma estrada pode ser
perdida, a depender do fator tempo, clima; aprendi que o desespero
vem, mas que saídas também existem, muitas vezes não são as
desejadas mas nem por isso deixam de ser saídas; aprendi que calma
em meio ao desespero é possível embora muitas vezes nos pareçam
impossível, mas ela funciona apenas se for solidificada em tempo de
céu azul e vento fresco no rosto; aprendi que nem sempre o que eu
sei funciona e que é necessário consultar um “GPS” pra acertar
a rota; aprendi que a mesma chuva que faz crescer o alimento pra
vida, pode causar morte quando estamos expostos a toda força por ela
produzida; aprendi também que infelizmente, somos afligidos por
circunstâncias que pareciam nunca mais tornar a repetir-se mas que
vem sem aviso ou atenuações. Também foi possível aprender que
mesmo que sejamos expostos a sofrimentos muitas vezes excruciantes,
ainda sim, apesar deles, é possível encontrar um novo motivo para
caminhar.
Vai doer, vai ferir mas pode acreditar, a felicidade vai
aparecer.
Vai!