Navio na neblina
Era o começo da década de 1990, minha família e eu estávamos
voltando da visita que fizemos, em um certo dia, a uma tia minha.
Morávamos em Guarujá e vindos de São Vicente, precisávamos
navegar em uma barca que fazia a travessia do canal do estuário
entre uma ilha e outra.
A
travessia era costumeira, sendo feita ainda hoje, da mesma forma que
há 30 anos. Mas algo habitual e rápido como esse percurso,
tornou-se uma aventura tensa e perigosa, trazendo-nos momentos
angustiantes.
A
noite era nublada, mas não esperávamos uma repentina e intensa
cerração, que desceu como uma imensa e pesada cortina a frente da
embarcação, obrigando o comandante a parar a navegação. Com o
desligar dos motores, a ventania balançava a barca, fazendo com que
uma certa quantidade de água invadisse o primeiro piso, eu conseguia
sentir os meus batimentos cardíacos resultantes do medo daquele
momento. Havia o temor de que uma colisão com outra embarcação
pudesse acontecer.
Alguns
instantes depois, o receio parecia se materializar e assustadoramente
um navio atracado ao cais, apareceu bem a nossa frente, fazendo com
que o desastre parecesse inevitável. A ventania tinha tirado a nossa
embarcação da rota correta e nos levado em direção a um imenso
cargueiro transcontinental. Sentimos, para o nosso alívio e das
dezenas de pessoas que estavam conosco, o ronco dos motores que com
perícia e agilidade, foram acionados pelo comandante a tempo de nos
desviar do impacto que parecia certo.
Não
muito tempo depois, a neblina cedeu e pudemos então chegar ao nosso
destino.
Que
alívio sentimos ao pisar em terra firme, embora a memória daqueles
instantes parecessem não se dissipar como a neblina que nos causou
pânico.
Desse
acontecimento fiz uma analogia com outras circunstâncias da vida: em
nossa trajetória temos sempre a ideia de que decidiremos ir de um
lugar a outro, de uma situação a outra, de uma decisão a outra,
sem ponderar a ocorrência de possíveis intempéries. Quando estas
aparecem, o medo parece ser a única coisa possível pois o otimismo
parece não existir quando o fatal parece assumir o lugar do vital.
É
bem verdade que muitas tempestades e densas neblinas, abatem e levam
a pique muitas embarcações, mas nem sempre será a nossa. Sendo
assim, voltar a navegar pode não ser das coisas mais fáceis a se
fazer, mas é possível, porque só assim é possível chegar ao
outro lado.
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