sábado, 29 de agosto de 2020

A carteira


 Perder é sempre ruim, seja uma perda grande ou pequena. Inversamente proporcional é a sensação de encontrar alguma coisa, podendo ser algo que se buscava intensamente ou aquilo que já se tinha dado como perdido. Há ainda aquelas situações nas quais encontramos coisas que não nos pertencem mas também não pertencem a mais ninguém e as somamos aos nossos ganhos ou quando possível a localização do(a) dono(a), podemos ter a satisfação de devolver aquele pertence.


Passamos a vida perdendo coisas e a perda de uma carteira é algo mais do que corriqueiro.


Lembro da vez em que perdi uma carteira quando eu voltava de um compromisso num sábado pela manhã. Na verdade só percebi a perda ao chegar em casa. Na hora aparece um sentimento ruim no meio do peito e em seguida a tensão do que aquela perda vai gerar – no meu caso, perdi algumas centenas de reais e ainda meus documentos como a habilitação para dirigir. Isso representava contas que não seriam pagas e horas perdidas para conseguir novos documentos.


Tentei ainda refazer o caminho no desejo de quem sabe, encontrar essa carteira num canto do caminho, torcendo para que uma pessoa mal intencionada não a encontrasse primeiro mas não tive sucesso.


No dia seguinte, uma viatura policial parou em frente a minha casa e dois agentes da polícia me chamaram pelo nome, o que me causou estranheza, mas ainda sim não associei essa visita inesperada com a perda da minha carteira, no entanto era justamente essa a razão pela qual eles estavam ali. A carteira foi encontrada a cerca de duzentos metros do caminho em que eu havia passado – nela estavam meus documentos mas o dinheiro foi todo roubado. “Gentilmente” eu suponho, deixaram os documentos jogados para que talvez eles chegassem até mim de volta, já que o mais “interessante” já estava ‘ganho’.


Inicialmente fiquei grato aos policiais que me trouxeram a carteira mas logo me preencheu a sensação de revolta ao pensar que o meu dinheiro ganho com trabalho honesto estava sendo desfrutado por uma pessoa oportunista e desonesta. Fui tentado também a supor uma possível desonestidade daqueles agentes, mas o correto é que o primeiro pensamento seja de confiar nos homens da lei.


E aqui reside a minha reflexão: pelo fato de sermos bombardeados por notícias de corrupção no ambiente público, em especial em instituições em que a justiça e a honestidade jamais deveriam ser objeto de questionamento, somos levados a ver com desconfiança muitos agentes públicos, reputando-os como potencialmente desonestos. Ao pensar assim cometemos também possíveis injustiças, pois culpar inocentes também é grave, mesmo que isso seja apenas feito num ambiente privado, pois pode tornar-se hábito para nós culpar quem não merece culpa e então podemos, sem o devido e correto senso crítico, injustiçar pessoas pelo caminho.


Só quando somos alvo de injustiças é que estamos gabaritados a entender quem é vítima delas. E pensar nisso me leva a lembrar aquela conhecida expressão popular: “Não queira para os outros, o que você não quer pra si”.

sábado, 22 de agosto de 2020

Mudar é preciso

Fernando Pessoa, o ilustre poeta português mas tão presente na cultura brasileira, imortalizou na literatura: “navegar é preciso, viver não é preciso”. Ao dizer isso, Pessoa não desprezava o valor da vida, mas enfatizava que para navegar é necessário planejamento, cálculos, entre tantas outras coisas, porém, na vida nem sempre há precisão, sendo que muitas vezes ela é imprecisa, surpreendente, imprevisível…

Tomo a liberdade a partir daqui, de parafrasear o autor lusitano e digo que “mudar é preciso” não apenas no sentido da necessidade mas também no sentido da exatidão. A vida pressupõe movimento e este por sua vez demanda mudança, seja no tempo, no espaço ou em ambos.

De modo prático, não estar disposto a mudança leva a nossa vida a um ponto inercial e improdutivo. Agarrar-se ao que conhecemos, como que fugindo das mudanças que certamente trazem o desconhecido, um dia nos porá frente a situações nas quais não saberemos como agir.

Recentemente, após muitos anos, mudei de casa, indo morar a milhares de quilômetros em distância. A mudança não foi apenas da região em que morava, mas da vida que eu tinha. Foi uma mudança necessária e muito importante no meu crescimento pessoal e de minha família também. Hoje, eu encaro as mudanças da vida como inevitáveis e transformadoras, nem sempre elas são fáceis mas por serem factíveis na vida, demandam de cada um de nós uma decisão do que fazer quando estamos diante delas: ou nos adaptamos a elas e crescemos num contexto de “360 graus” ou esmorecemos e quedamos silentes, aterrorizados, confusos e talvez até depressivos.

É verdade que é mais fácil falar do que fazer, mas também é verdade que mudanças podem ser oportunidades maravilhosas de fazer a nossa vida tão plena como sequer poderíamos imaginar um dia. 

Dizem que toda viagem (aqui significando mudança) começa com um primeiro passo, e é verdade, mas eu entendo que uma viagem, seja ela de que tamanho for, começa um pouco antes: nasce dentro de nós, em nossa decisão.

Uma história contada por meu pai

  Acho interessante quando, mesmo em meio a era da internet de alta velocidade, com todas as inovações por ela trazidas, pais ainda contam ...